A decisão judicial que suspendeu o aplicativo Telegram no Brasil é bem fundamentada e não viola direitos fundamentais como liberdade de expressão e proteção da privacidade, avaliam juristas. Advogados ouvidos pela reportagem explicaram que há indícios consistentes de crimes associados ao grupo neonazista criado na plataforma e que a Polícia Federal tem a prerrogativa e o dever de levar a investigação adiante. E também lembram que não é a primeira vez que o Telegram descumpre ordens judiciais.
— Trata se de uma decisão que vem na linha daquilo que o TSE já tinha defendido antes. Houve decisão anterior, do ministro Alexandre de Moraes, de suspender o Telegram porque ignorava ordens judiciais. Em um estado democrático de direito não se faz isso, não pode ter essa postura. A medida agora foi extrema até porque não é a primeira vez. Pode ser considerado obstrução à justiça, o Telegram não está colaborando — afirmou Marco Antonio Sabino, professor da Ibmec SP, sócio do Mannrich e Vasconcelos Advogados e especialista em direito digital.
Sabino destaca que a PF pediu os dados dos integrantes do grupo neonazista investigado à plataforma, que respondeu que precisaria dos telefones deles. A PF, então, informou que, caso tivesse os telefones, ela mesma já poderia fazer a investigação. Por isso, diante da demora em responder, a justiça aumentou a multa em relação ao pedido, de R$100 mil para R$1 milhão, e determinou a suspensão do aplicativo no país.
— Não há dúvida de que é necessário investigar essas pessoas e o conteúdo que transita nesse grupo. Indícios levam a crer que há crime, então a política tem obrigação de investigar, e a plataforma de colaborar. A ordem não é para a plataforma avançar no conteúdo, é para fornecer os dados. Quem vai avançar no conteúdo é a polícia — disse Sabino, que rechaça possível apontamento de violação de liberdade de expressão. — Acho que não há abuso. É preciso saber mais sobre esse grupo, porque podem ter situações de crimes que não são acobertadas pela liberdade de expressão ou direito à privacidade.
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No ano passado, quando o aplicativo foi suspenso pelo ministro do STF Alexandre de Moraes, o presidente Bolsonaro e seus apoiadores levantaram a bandeira da liberdade de expressão, em defesa do Telegram. Assim como Sabino, o advogado Alexander Coelho, especializado em direito digital e proteção de dados e sócio do escritório Godke Advogados, acredita que essa suposta violação não se concretizou na decisão desta quarta.
— Os valores fundamentais não foram violados, pelo o que pude ver. Tudo seguiu rito dentro de uma investigação da PF, que é uma instituição idônea. De fato, pelo o que ficou demonstrado, a rede social não respondeu a contento. Então é legítimo pedir esses dados, faz parte da investigação, a PF tem essa prerrogativa — explicou Coelho.
Fonte: O Globo